A doença curável frequentemente confundida com demência


Associação americana estima que 700 mil americanos tenham HPN, mas apenas cerca de 20% dos que vivem com a doença foram diagnosticados corretamente. Depois de passar anos sem poder viajar sem uma cadeira de rodas, John Searle finalmente pode tirar férias com sua esposa Barbara Gaal/Arquivo Pessoal Quando John Searle começou a cair e perder a memória, ele pensou que eram os primeiros sinais de demência. Na verdade, ele tem uma condição rara — e muitas vezes não diagnosticada — chamada hidrocefalia de pressão normal, a HPN. A boa notícia é que ela é tratável. Alguns anos atrás, Searle pensou que sua vida estava mudando para sempre. Seu corpo tinha parado lentamente de funcionar. Ele tinha dificuldade para andar. Quando tentava, caía. Tinha má memória de curto prazo e, aos 69 anos, estava com incontinência urinária. Era um padrão de declínio que o engenheiro canadense aposentado de Brantford, Ontário (Canadá), conhecia muito bem. Sua irmã morreu de Alzheimer aos 50 anos. Seu pai morreu de demência no início dos anos 1980. Então, ele começou a planejar um futuro do qual ele não poderia participar. "Você se pergunta para onde está indo. Você começa a pensar, 'é isso?'", diz. Incerteza no diagnóstico Os médicos não puderam dar a ele um diagnóstico definitivo, o que só enfureceu ainda mais o engenheiro aposentado. O tratamento para Parkinson não teve efeito, ele não tinha Alzheimer, mas algo claramente não estava certo. Em 2018, ele precisava de uma cadeira de rodas para sair de casa e de um andador para caminhar. "Não havia esperança. Eu ficava sentado na janela vendo a vida passar." "Ele estava com raiva — com algo além de raiva", lembra sua esposa Barbara. "Havia noites em que eu estava deitada na cama pensando que talvez tivesse que vender a casa... porque eu tinha que fazer tudo." Mas isso mudou quando ele conheceu o dr. Alfonso Fasano, um neurologista da Clínica de Distúrbios do Movimento, do Toronto Western Hospital, que o diagnosticou com a doença chamada hidrocefalia de pressão normal. O distúrbio é causado quando o excesso de líquido cefalorraquidiano, conhecido como fluido cérebro espinhal, se acumula nos ventrículos do cérebro, que são o centro de comunicação cerebrais. Esse acúmulo de líquido pode causar dificuldades de movimento, problemas de memória e cognição e incontinência - sintomas que também costumam estar associados a doenças degenerativas mais comuns, como Alzheimer, Parkinson ou demência. Mal pouco entendido A Hydrocephalus Canada estima que pelo menos 1 em cada 200 canadenses com mais de 55 anos de idade, ou mais de 57 mil pessoas, tenham HPN. Nos EUA, a Hydrocephalus Association estima que 700 mil americanos tenham a doença, mas que apenas cerca de 20% das pessoas que vivem com ela foram diagnosticadas corretamente. "A HPN é uma condição que ainda não é bem entendida", diz Fasano. Sem tratamento, as pessoas podem acabar em um asilo ou morrer por conta das complicações da doença. "É isso que não queremos", diz ele. Searle ouviu pela primeira vez sobre a HPN quando viu um especialista em tratar enxaquecas em 2003. Uma ressonância magnética revelou fluido nos ventrículos do seu cérebro, mas por não apresentar nenhum dos sintomas mais comuns, ele não foi diagnosticado. Em 2014, depois de vários anos apresentando sintomas como perda de memória e dificuldade de mobilidade, os médicos fizeram uma punção lombar para drenar algum fluido de seu cérebro e ver se seus sintomas melhoravam - um teste comum para o HPN. Como os sintomas do Searle não melhoraram, seus médicos determinaram que a HPN não deve ser a culpada. Oito anos depois, com sua saúde se deteriorando rapidamente, ele conheceu Fasano e concordou em fazer o teste novamente. Desta vez, sua esposa Barbara percebeu pequenas melhorias - tão pequenas que nem mesmo o marido as notou. "Ele não podia acreditar", disse ela. "Foi quase como 'se eu acreditar e eles estiverem errados, será uma grande decepção'." Fasano sugeriu que eles drenassem novamente o fluido do cérebro, o tratamento de ponta para a HPN, com uma alta taxa de sucesso, segundo estudos recentes. Mais de um ano depois, Searle conta que está começando a recuperar sua vida. Sua capacidade de caminhar melhorou, assim como sua memória. Ele regularmente se exercita com um personal trainer na academia e faz caminhadas para ajudar a recuperar sua força. "A operação é apenas 50%, o resto é a sua mentalidade", diz ele. Vida de volta Embora ele ainda não tenha sua carteira de motorista, Searle e sua esposa começaram a viajar novamente. Eles foram para a Flórida no inverno passado e estão planejando viagens para Las Vegas e Jamaica. Barbara diz que a maior mudança é o humor do marido. "A apatia que o atormentava desapareceu. Ele está alegre de novo." Fasano diz que desde que a história de Searle foi compartilhada na imprensa, a clínica tem sido sobrecarregada com pedidos de pacientes que acreditam ter sido diagnosticados erroneamente e possuem HPN. Embora o diagnóstico errôneo do HPN seja um problema real, o Fasano alerta que a maioria das pessoas diagnosticadas com mal de Parkinson ou Alzheimer tem o diagnóstico correto - especialmente se elas foram avaliadas por um neurologista. Até 3% da população com mais de 65 anos de idade pode ter HPN, de acordo com um estudo recente do Japão. A Organização Mundial de Saúde estima que a demência, incluindo a doença de Alzheimer, afeta entre 5-8% da população com mais de 60 anos. "Esta é uma doença que provavelmente é mais comum do que pensamos, e pode ser tratada muito bem, com uma enorme mudança de qualidade de vida para essas pessoas", afirma o médico. "Ao mesmo tempo, muitas pessoas agora acreditam que, se têm Parkinson, foram diagnosticadas erroneamente. Todos esperam que o médico esteja errado."

Fonte: Globo.com
Proxima
« Anterior
Anterior
Proxima »