Lições portuguesas sobre cuidados paliativos


Desde 2012 a população daquele país tem acesso a esse tipo de atendimento, que alivia a dor e melhora a qualidade de vida do paciente Na quinta-feira passada, acompanhei a abertura do I Congresso de Cuidados Paliativos do Rio de Janeiro. O médico Paulo Reis Pina, professor assistente da Universidade de Lisboa e diretor da unidade de cuidados paliativos Domus Fraternitas, em Braga, deu uma aula sobre a experiência portuguesa nesse campo. Naquele país, pela Lei 52/2012, todos têm acesso ao atendimento, mas ele afirma que a qualidade deste ainda não está totalmente disseminada: “não se pode achar que o cuidado paliativo se restringe à infusão de opioide ou morfina. Em doses erradas, pode ser o mesmo que uma eutanásia ativa”. Apaixonado pelo que faz e um evangelizador da relevância desse tipo de atendimento, o doutor Paulo Pina diz que faz questão de usar o termo no plural, “porque os cuidados paliativos são muitos, mas o que prefiro é a expressão medicina paliativa, porque não se trata de algo alternativo, e sim de ciência: selecionamos e validamos fármacos, ajustamos doses. Esta é uma especialidade tão relevante quanto as demais”. O médico Paulo Reis Pina, professor assistente da Universidade de Lisboa e diretor da unidade de cuidados paliativos Domus Fraternitas, em Braga Divulgação Portugal tem oito escolas de medicina e, apesar da legislação prever o acesso ao atendimento, o médico é crítico em relação à formação dos alunos: “74% nunca estiveram numa unidade de cuidados paliativos e a maioria ainda vê a especialidade como uma ferramenta a ser usada apenas no fim da vida, o que é um equívoco”. A associação é frequente, como se essa fosse uma abordagem terapêutica reservada ao paciente em seu leito de morte. No entanto, cuidados paliativos abrangem tudo o que pode ser oferecido à pessoa que tenha uma doença fora de possibilidade de cura, com o objetivo de melhorar a qualidade da sua existência – que pode se estender por muito tempo. Vai do controle de sintomas como dor, náusea e vômito até a ansiedade e o medo, passando pela comunicação com a família do doente. De acordo com o doutor Pina, outro objetivo a ser alcançado é capilarizar o serviço, que ainda está concentrado na rede hospitalar, estendendo-o às comunidades – boa parte dos pacientes poderia ser tratada em casa. Para a plateia que lotou o evento, deixou um recado: “vejo que há um encantamento com os cuidados paliativos, mas preparem-se, porque esse é um mundo de sofrimento e de dor. O que fazemos é validá-lo, lhe dar acolhimento”. Logo em seguida, o geriatra André Filipe Junqueira dos Santos, presidente nacional da ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos), traçou um panorama das políticas públicas existentes por aqui. O Brasil dispõe de uma resolução, de outubro de 2018, estabelecendo que os cuidados paliativos devem integrar a RAS (Rede de Atenção à Saúde). É apenas o primeiro passo. Há 177 serviços no país, de acordo com o último levantamento, realizado em 2018. No entanto, 103 estão na Região Sudeste e 74% em hospitais, reforçando a prática de este ser um atendimento voltado para o fim da vida. O geriatra André Filipe Junqueira dos Santos, presidente nacional da Academia Nacional de Cuidados Paliativos Divulgação “No Brasil, há 300 faculdades de medicina, mas no máximo umas 20 apresentam os cuidados paliativos em seu currículo. Todo profissional de saúde deveria saber acolher e dominar o manejo de cuidados paliativos, que deveriam estar integrados à atenção primária da população”, ressaltou, lembrando que, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), 40 milhões de pessoas demandam esses cuidados por ano, mas 86% delas não recebem o atendimento devido e 83% não são beneficiadas com o alívio da dor.

Fonte: Globo.com
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