França vai testar maconha medicinal em estudo com 3 mil pacientes
Pacientes que sofrem de câncer, esclerose múltipla, alguns tipos de epilepsia e dores neuropáticas refratárias aos remédios convencionais terão acesso a derivados do cannabis sob vigilância hospitalar. Os deputados franceses aprovaram nesta sexta-feira (25) um projeto experimental autorizando o uso da maconha medicinal no tratamento de algumas doenças graves. Durante dois anos, 3.000 pacientes que sofrem de câncer, esclerose múltipla, alguns tipos de epilepsia e dores neuropáticas refratárias aos remédios convencionais terão acesso a derivados do cannabis sob vigilância hospitalar. Esses pacientes poderão tomar combinações de canabidiol (CBD) e THC, dois derivados da maconha, receitadas pelo especialista que os acompanha no cotidiano. Inicialmente, a pessoa irá retirar o produto na farmácia de um hospital credenciado que irá monitorar todo o tratamento. Tudo correndo bem, o doente poderá comprar o cannabis terapêutico numa farmácia qualquer. A Agência Francesa de Medicamentos (ANSM) autorizou apresentações variadas dos derivados da maconha: na forma de óleos, chás de ervas e flores secas de cannabis, destinadas à administração por meio de inalação. O primeiro grupo de participantes deverá começar o tratamento no primeiro semestre de 2020. O sistema público de saúde vai custear as despesas. Correndo atrás do atraso Atualmente, 21 países dos 28 membros da União Europeia autorizam o cannabis medicinal em graus diferentes. A França registra um atraso em comparação com os vizinhos. Por isso, esse protocolo experimental é considerado um avanço e deve contribuir para esclarecer os benefícios e eventuais pontos negativos da prescrição. Daqui a dois anos, a expectativa é que a utilização do produto seja ampliado. O autor do projeto de lei, o deputado Olivier Véran, é médico neurologista. Ele explica que a maconha terapêutica precisa ser ajustada a cada paciente: alguns se sentem melhor apenas com o canabidiol, que promove um relaxamento muscular, outros com uma combinação do canabidiol com o THC, a substância psicoativa da maconha. Véran considera fundamental observar os efeitos dessas substâncias em um estudo científico e não deixar as pessoas se automedicarem, sem acompanhamento, como acontece atualmente. Os médicos franceses costumam receitar o tratamento para quem precisa. Com a receita em mãos, muitos franceses buscam o cannabis medicinal nos países vizinhos, onde não é mais proibido. Um decreto de 2013, autorizou que alguns medicamentos para o tratamento da esclerose múltipla usassem o canabidiol em sua composição, mas os produtos nunca chegaram às farmácias por falta de um acordo sobre o preço final. Soluções domésticas A Agência Francesa de Medicamentos (ANSM) estima que entre 300.000 e 1 milhão de franceses poderiam ter suas dores amenizadas pelo uso da maconha medicinal. Mas como o produto demora para ser legalizado, os pacientes buscam soluções domésticas. Muitos franceses passaram a cultivar a planta em casa e a fabricar chás e pastilhas para colocar em baixo da língua, já que o gosto da planta parece ser bem ruim. Outros recorrem aos famosos “spacecakes”, bolos feitos com a planta e ingredientes tradicionais. O problema é que existem tipos diferentes de cannabis, e a concentração dos componentes varia de uma planta para outra. Os doentes penam até descobrir a fórmula ideal, capaz de aliviar seu problema de saúde. A maioria recorre à automedicação, consultando livros e artigos científicos. Outros contam que conseguem comprar produtos à base do THC, o princípio psicoativo da maconha, pela internet, mas se sentem desamparados por não saber o que estão consumindo de verdade. Como a lei francesa proíbe, mas a legislação europeia autoriza a venda de produtos com uma taxa de THC inferior a 0,2%, lojas passaram a comercializar fórmulas de baixa concentração. Porém, para alguns pacientes, a dose é insuficiente para aplacar a dor. Trinta países O projeto de lei aprovado pelos deputados nesta sexta ainda não autoriza o plantio do cannabis na França. As autoridades sanitárias terão de se abastecer no exterior. Na Europa, quatro países legalizaram o cultivo da maconha para esse fim: Holanda, Dinamarca, Portugal e Grécia. No mundo, a maconha terapêutica já é autorizada em cerca de 30 países. O Canadá foi o pioneiro, em 2001. Depois vieram Israel, em 2006, e recentemente os Estados Unidos, onde 33 estados regularizaram o tratamento. O importante, segundo os defensores, é que as condições de utilização e o acompanhamento médico sejam bem definidos. Entre os europeus, a França é recordista no consumo de maconha, principalmente entre os jovens. Por outro lado, a classe médica ainda não chegou a um consenso sobre os benefícios de seu uso medicinal. Logo depois da votação na Assembleia Nacional, o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que o Ministério da Saúde trabalha numa solução para o uso terapêutico do cannabis. Mas ele destacou que continua contrário à legalização da maconha para fins recreativos. Planta de 'Cannabis sativa', da qual é possível extrair o canabidiol Kimzy Nanney/Unsplash
Fonte: Globo.com
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